Quatro anos depois: balanço da situação dos(as) atingidos(as) de Barra Longa

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O crime-desastre de Fundão provocou uma série de danos e prejuízos à população de todas as cidades por onde a lama de rejeitos passou. Em Barra Longa, para levantar os danos sofridos e contribuir na sistematização das pautas da população, a assessoria técnica vem organizando os debates e as reflexões a partir dos eixos de Trabalho e Renda, Moradia e Saúde. A seguir, listamos os avanços e as conquistas alcançados pelos atingidos de Barra Longa em cada um dos eixos destacados nos quatro anos de luta e quais são os desafios colocados no âmbito da reparação integral.[/vc_column_text][thb_gap height=”50″][vc_column_text]

Por Danielle Passos Jorge (arquiteta), Aline Pacheco Silva (psicóloga), Juliana Cobuci (assistente social), Lina de Anchieta Sales (mobilizadora social) e Isabel Gonçalves Cordeiro (assistente social)

Com o apoio de Leandro Borges Raggi (mobilizador social) e Wigde Arcangelo

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Trabalho e Renda

[/vc_column_text][thb_gap height=”25″][vc_column_text]No que diz respeito aos danos referentes ao trabalho e à renda dos(as) atingidos(as), pouco se avançou na reparação. Hoje, a grande pauta se coloca em torno do reconhecimento dos diagnósticos, levantamentos e entendimento elaborados pelos(as) atingidos(as) em parceria com a assessoria técnica a partir dos Grupos de Base nos bairros e na zona rural da cidade de Barra Longa e também nos Seminários Temáticos – divididos por categorias de trabalho e atividades produtivas. Os dados levantados nos Grupos de Base demonstram que, de 953 pessoas, 672 tiveram aumento dos gastos por decorrência do crime-desastre. Já os Seminários Temáticos demonstraram que, do total de 1.217 pessoas que participaram, o que corresponde a 19,81% da população, todas as categorias profissionais informaram ter havido alterações nas suas fontes de renda em virtude da sua diminuição ou perda. Essa situação se explica, na maioria dos casos, devido à interrupção de muitas atividades produtivas, como a agricultura e a pesca, o que inviabilizou o acesso à renda proveniente delas.

Outro fator determinante da configuração atual do trabalho e da renda das famílias de Barra Longa se refere às despesas geradas por novos gastos, todos determinados por situações oriundas do rompimento da barragem, como aluguéis, despesas com tratamentos de saúde e medicação, despesas com alimentação (devido à perda das áreas agricultáveis), material de construção e reformas (devido às trincas e rachaduras causadas pelo intenso tráfego de caminhões e máquinas pesadas na retirada de parte do rejeito), transporte, material de limpeza, entre outras.

Sobre o aumento dos gastos, destaca-se o acréscimo significativo de despesas relativas à saúde e à alimentação, o que indica situação de insegurança e risco alimentar vivenciada, hoje, pelas famílias. Essa realidade aponta para a necessidade de construção de um plano de reabilitação econômica para o município visto que a cidade, atualmente, vivencia um rompimento do seu ciclo produtivo e um processo de empobrecimento acelerado.

Outro grande problema existente no território é o não reconhecimento, por parte da Fundação Renova, do trabalho das mulheres. Os dados levantados demonstram que a perda de trabalho e renda atingiu profundamente as mulheres do município, uma vez que a inserção desse grupo social se dava, predominantemente, via atividades informais, ou seja, sem quaisquer garantias trabalhistas e que, após o crime-desastre, foram prejudicadas pela inviabilidade de sua continuidade, como é o caso das trabalhadoras que produziam itens para comercialização. Além disso, destaca-se o não reconhecimento do trabalho de cuidados – com o lar, de familiares adoecidos e/ou idosos, de crianças – realizado, em sua maioria, por mulheres e que são essenciais para que o trabalho e a renda da família sejam garantidos. Sobre essa questão, a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo produziu um parecer bastante completo, que evidencia essa tratativa no que tange à vida das mulheres para a reparação do crime-desastre.

É importante destacar que, hoje, o grande empecilho na reparação integral do crime-desastre é, sem sombra de dúvidas, a própria responsável pela reparação, a Fundação Renova, que opera com base em forte seletividade, ao estabelecer critérios não fundamentados na realidade territorial local, o que dificulta o acesso das famílias aos recursos destinados a reparação, como o Auxílio Financeiro Emergencial (AFE), que não é pago à totalidade de atingidos(as) do município tendo em vista os procedimentos adotados pela Fundação para o reconhecimento das pessoas enquanto atingidos(as).[/vc_column_text][thb_gap height=”50″][vc_column_text]

Saúde e Ambiente

[/vc_column_text][thb_gap height=”25″][vc_column_text]Desde a chegada da lama de rejeitos no município de Barra Longa, a população atingida vivencia profunda alteração nos seus modos de vida, ambiente, alimentação, sossego e tranquilidade. Para compreender os efeitos de tais alterações na vida e na saúde das pessoas, diversos estudos foram realizados e seus resultados demonstram o adoecimento da população. Essa situação é comprovada também pelo significativo aumento do número de atendimentos médicos realizados pelo SUS desde o rompimento, que passou de 2.583 atendimentos, no ano de 2014, para mais de 4.000 atendimentos, em 2018. 

Segundo dados coletados pela equipe do EPISUS/Ministério da Saúde, a maior parte dos atendimentos diz respeito a problemas respiratórios, hipertensão arterial, diabetes, transtorno mental e depressão, e problemas de pele. Outros estudos já realizados no território (Instituto Saúde e Sustentabilidade, Rede de Médicos Populares, AEDAS) apontam para as mesmas queixas relatadas pela população. Além disso, pesquisas também demonstram contaminação de pessoas por metais tóxicos (Instituto Saúde e Sustentabilidade) e contaminação do ambiente em Barra Longa (UFOP, AMBIOS, JACOBS, TECHNOHIDRO). O contato com os metais pode acontecer por diversas vias, afinal o rejeito de minério que invadiu o centro da cidade foi retirado dessa área sendo descartado no Parque de Exposição do município, em depósitos de rejeitos na zona rural, foi usado para calçamento das ruas dos altos dos morros e das estradas rurais e ainda se encontra no município

Fica claro que a convivência diária com o rejeito, as mudanças nos modos de vida da população, as mudanças na alimentação e as constantes violações de direitos pelas empresas trazem, consigo, o adoecimento de toda a população do município de Barra Longa.[/vc_column_text][thb_gap height=”50″][vc_column_text]

Moradia

[/vc_column_text][thb_gap height=”25″][vc_column_text]Com o rompimento da Barragem de Fundão, o  centro urbano e as zonas rurais do município de Barra Longa foram invadidos pela lama de rejeitos da Samarco, Vale e BHP Billiton. Com isso, a cidade sofreu vários danos relacionados à moradia e à infraestrutura, tanto urbana quanto rural. Com o início dos trabalhos da assessoria técnica, ficou evidente, nos relatos dos(as) atingidos(as), os problemas relacionados à chegada da lama de rejeito, bem como outros, que surgiram em decorrência do processo de sua retirada. Uma das ações executadas pelas empresas foi a retirada de parte da lama de rejeitos do centro da cidade, que foi levada para o Parque de Exposição, no local onde residem oito famílias. Esse parque era utilizado como espaço para a realização de diversos eventos, festas, campeonatos e jogos, e era o principal espaço de lazer do município. A empresa não consultou os moradores e depositou toneladas de lama tóxica próximas às casas das famílias. Houve, durante meses, intensa movimentação de maquinários pesados e de caminhões no local. Isso fez com que as estruturas das casas fossem abaladas, e surgiram trincas e rachaduras em muitas delas. As famílias passaram a conviver com poeira, diversos veículos, trabalhadores desconhecidos das empresas e muito barulho. 

Em setembro de 2017, a Fundação Renova assinou um acordo com as oito famílias moradoras do Parque de Exposição. Seis famílias optaram por sair do local durante o período de reforma de suas casas e das estruturas do parque e ir para moradias temporárias alugadas pela Fundação. Hoje, passados mais de dois anos do acordo, a reforma do parque está parada, assim como a reforma das casas das famílias. Além disso, não se sabe qual o risco de contaminação presente no local. Antes, essas famílias possuíam fortes laços comunitários e afetivos. Conviviam, trocavam alimentos das hortas e plantas medicinais. Hoje, possuem modos de vida completamente modificados, principalmente, as pessoas idosas que, por estarem há tanto tempo fora de suas casas, têm apresentado quadros de depressão, tanto pela alteração do seu modo de vida, quanto pela forma como vêm sendo tratadas pela Fundação Renova.

Até hoje, a grande maioria das casas que sofreram danos decorridos ou da chegada da lama de rejeitos, ou de sua retirada, ainda não foram reparadas e os(as) atingidos(as) organizados(as) fizeram a luta para o reconhecimento dos danos sofridos e do direito à reparação. Com a aprovação dos parâmetros e das diretrizes da moradia pelos(as) atingidos(as), foi garantido o direito à equipe de acompanhamento técnico. Foi por meio da luta e da organização dos(as) atingidos(as) que foi conquistado o direito de ter uma equipe de confiança para acompanhar as famílias do centro, das comunidades da zona rural e o reassentamento de Gesteira em todo o processo de reparação das moradias.

A comunidade de Gesteira, com assessoria técnica, escolheu o terreno para o reassentamento. Esse terreno foi comprado pela Fundação Renova e, atualmente, estão sendo feito furos de sondagem para estudos. Importante ressaltar que o tamanho do terreno anterior  proposto pela Fundação Renova era seis vezes menor, e não caberia toda a comunidade a ser reassentada. Hoje, para as 37 famílias a serem reassentadas, é garantida, além do terreno, a construção de uma casa.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]