Nossas histórias debaixo dos pés de frutas

[vc_row][vc_column][vc_column_text]Por Maria das Dores (Dorinha), Maria das Graças Quintão, Marinalva Salgado, Mônica Quintão, Sonia Nazaré dos Santos e Wuilsom Emiliano dos Santos

Com o apoio de Larissa Helena, Miriã Bonifácio, Sérgio Papagaio e Simone Silva

Fotos: Mônica Quintão e Sergio Papagaio

Se os nossos pés de frutas falassem, quantas histórias eles teriam para contar? As árvores são como abrigos: nos dão sombra, segurança, amor. Em nossas comunidades, elas não só nos alimentavam, protegiam e embelezavam as paisagens, como também guardavam nossos segredos, nossos sonhos, nossas histórias. Algumas se foram logo naquele dia 5 de novembro, outras resistiram, ou resistimos por elas. Mas ainda hoje recebemos notícias das que estão morrendo, indo embora aos poucos, sem conseguirem sobreviver ao baque. Estes depoimentos são uma homenagem de todos os atingidos pela Barragem de Fundão para as “amigas” que construíram em suas memórias momentos inesquecíveis.

-[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row css=”.vc_custom_1516301134747{margin-top: 24px !important;}”][vc_column][thb_image image=”952″][ultimate_heading sub_heading_margin=”margin-bottom:24px;”]Os pés de fruta que restaram em Bento Rodrigues estão perdendo a folhagem e morrendo.[/ultimate_heading][thb_border][vc_column_text]A gente tinha vários pés. Era acerola, limão doce, jabuticaba, pitanga. Tinha muita variedade. Eu adorava subir no pé de jabuticaba, porque gostoso é subir no pé e panhar a fruta. O jeito mais gostoso de comer fruta é assim. Vocês nem imaginam como é bom isso. Agora, a gente tem que comprar, mas não tem o mesmo sabor, porque o sabor está em você pegar a fruta direto no pé. Não tem como descrever como era maravilhosa essa vida nossa. Lembro que lá em casa eram dois pés de jabuticaba e minha mãe só deixava a gente subir depois da famosa chuvinha da jabuticaba. Então, quando dava a chuvinha, era bom demais, as crianças ficavam juntas comendo aquelas que davam nos galhos baixinhos. No lugar que a gente morava não sobreviveu nada, acabou tudo. Só tem mato e a água [Dique S4], que agora tá chegando lá. Nem das casas que sobraram existe mais algum pé, eles todos morreram com a lama. A Samarco tirou esse privilégio da gente viver, porque hoje a gente não vive, a gente vegeta.

Marinalva Salgado, moradora de Bento Rodrigues

[/vc_column_text][/thb_border][/vc_column][/vc_row][vc_row css=”.vc_custom_1516301149065{margin-top: 24px !important;}”][vc_column width=”1/2″][thb_border][vc_column_text]Desde que me entendo por gente, conheço este ipê. As flores que nascem nele são muito bonitas, de cor rosa, mas nós quase perdemos ele. Primeiro a Samarco cortou uns galhos para que pudessem passar com as máquinas. Depois, estavam cavando um espaço para que o esgoto pudesse passar e, aí, então, cortaram algumas raízes e o ipê começou a se inclinar. Brigamos e conseguimos que eles mudassem o esgoto de lugar, porque se continuassem com esse trabalho, ele iria morrer.

Maria das Dores de Sousa, moradora de Barra Longa

[/vc_column_text][/thb_border][/vc_column][vc_column width=”1/2″][thb_image image=”954″][ultimate_heading]Pé de ipê no Parque de Exposições de Barra Longa[/ultimate_heading][/vc_column][/vc_row][vc_row css=”.vc_custom_1516301164775{margin-top: 24px !important;}”][vc_column][thb_border][vc_column_text]O pé de manga fazia parte da nossa vida, era como se fosse um membro da família. Quando iam podar ele, a gente ficava vigiando pra não cortar muito. Lembro que teve uma vez que cismaram que o pé estava prejudicando a Igreja e que eles iam ter que cortar. Foi uma briga danada, meu pai não queria deixar, tudo por causa do pé de manga. Quando compramos nossa casa, os pés de manga já existiam, então meu pai fez bancos de pedra embaixo deles e a gente usava a sombra pra conversar, namorar, dava até pra deitar. Era um lugar onde a gente sempre se reunia. Aos domingos, sentavam todos lá, era muito bom. A relação que criamos com o pé de manga é muito forte. Tanto é que, agora, ele está lá morrendo e o sentimento é de que estarmos perdendo um membro da família. Eu cresci subindo naqueles pés. Não tem nada melhor que subir num pé de fruta pra comer, né? Principalmente, jabuticaba e manga. E faz falta subir, sabe? Mesmo que seja subir por subir, era bom demais.

Maria das Graças Quintão e Mônica Quintão, moradoras de Bento Rodrigues

[/vc_column_text][/thb_border][/vc_column][/vc_row][vc_row css=”.vc_custom_1516301500066{margin-top: 24px !important;}”][vc_column][thb_border][vc_column_text]Lá em casa, tinha vários pés de fruta, por exemplo, pés de acerola, mamão, carambola, manga, banana e o principal era o pé de goiaba, que tem história demais.  Quando era época de goiaba, a gente subia no pé para panhar as frutas, que eram muito gostosas e docinhas, não davam bicho. Eu, minhas irmãs e sobrinhos ficávamos brincando de achar a maior goiaba do pé. Era muito divertido. O pé de manga era diferente. A gente levantava cedo para ir chupar porque as mangas estavam mais fresquinhas. Eram muitas, as mais docinhas que eu já chupei na vida. Igual aquelas eu acho que nunca mais vou encontrar. Lá tinha pé de coco também. A gente pegava a casca dele pra poder brincar de escorregar com os nossos primos, era muito divertido, dávamos risadas demais. A gente ficava feliz que tinha fruta pra comer. Meu pai ficava orgulhoso de ver os pés dando frutas. Tinha várias árvores que a gente brincava embaixo delas, fazia piquenique. Era o tempo todo lá de baixo, até dormir a gente dormia. Quando a lua estava clara era muito bom. Mas, depois do dia 5 de novembro de 2015, que teve esse crime da Samarco, nossos sonhos foram embora. Ela arrancou tudo o que a gente tinha de maravilhoso, agora são só lembranças, porque nunca mais vai ser como antes. É muito triste dizer isso, só Deus pra ter misericórdia da gente.

Sonia Nazaré dos Santos e Wuilsom Emiliano dos Santos, moradores de Pedras

[/vc_column_text][/thb_border][/vc_column][/vc_row]