Direito de Entender: Os danos que podem ser indenizados

Por Guilherme de Sá Meneghin

Promotor de Justiça – 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Mariana / MG

Do ponto de vista jurídico, os  prejuízos às vítimas de toda a Bacia do Rio Doce pelo desastre da Barragem de Fundão, da mineradora Samarco, traduzem-se em danos, que devem ser reparados pelo causador, nos termos do artigo 927 do Código Civil: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Os danos, porém, não são todos iguais, havendo no direito nacional uma importante classificação que auxilia na identificação dos prejuízos.

Os danos patrimoniais ou materiais atingem os bens corpóreos das vítimas. Segundo o autor Flávio Tartuce, esses danos dividem-se em duas espécies: (a) Danos emergentes ou danos positivos – “o que efetivamente se perdeu. Como exemplo típico, pode ser citado o estrago do automóvel, no caso de um acidente de trânsito. […]”; (b) Lucros cessantes ou danos negativos – “o que razoavelmente se deixou de lucrar. No caso de acidente de trânsito, poderá pleitear lucros cessantes o taxista, que deixou de receber valores com tal evento, fazendo-se o cálculo dos lucros cessantes de acordo com a tabela fornecida pelo sindicato da classe […]”.

Já os danos morais ou imateriais afetam os direitos da personalidade, ou seja, os direitos que asseguram a dignidade da pessoa humana, como a liberdade, a intimidade, a privacidade, a honra, a tranquilidade e outros atributos inerentes ao ser humano. Por certo, a destruição da moradia é um típico caso de dano moral, que se soma ao dano patrimonial, porque as pessoas perderam sobretudo a tranquilidade do lar que desfrutavam, gerando sofrimento e tristeza intensos.  

[…] a apuração dos danos individuais não exclui a reparação pelos danos coletivos, que serão examinados em outra oportunidade.

Há ainda um outro tipo de dano, os chamados danos estéticos. São aqueles que provocam uma deterioração na aparência física da pessoa, causando um prejuízo distinto do dano moral como, por exemplo, uma cicatriz na face.

O dano pela perda de uma chance ocorre quando o ofendido perde uma oportunidade. O caso mais famoso já julgado aconteceu em virtude do programa televisivo “Show do Milhão”, em que a participante chegou à pergunta do milhão e todas as respostas apresentadas na questão estavam erradas. Nesse caso, embora a participante não tenha respondido, ela perdeu a oportunidade sequer de tentar, o que levou o Superior Tribunal de Justiça a condenar o SBT a indenizar a participante pela “perda de uma chance”.

O mesmo raciocínio vem sendo adotado para o dano ao projeto de vida. Esse dano decorre da abrupta interrupção de objetivos de vida que estavam em andamento como, por exemplo, uma pessoa que já tinha adquirido um terreno para construir uma casa, tendo a propriedade ficado imprestável após ser coberta pela lama.

Além desses danos, se destaca o dano pela perda do tempo útil, comumente aplicado nas relações de consumo. Quando para resolver um problema causado pelo fornecedor o consumidor despende excessivamente seu tempo, que poderia ser usado para outras finalidades, há um desperdício de tempo do consumidor, que deve ser indenizado. Tal hipótese também pode ser aplicada às incontáveis reuniões e assembleias de que participam os atingidos, em virtude das delongas da Samarco e da Fundação Renova.

Diante disso, o formulário do cadastro de atingidos que está em andamento  visa relacionar todos esses danos de natureza individual sofridos, para possibilitar posteriormente a reparação e ressarcimento. Importante ressaltar que a apuração dos danos individuais não exclui a reparação pelos danos coletivos, que serão examinados em outra oportunidade.