Editorial (julho/2018)

Capa da ediçâo 28 do Jornal A Sirene

(Foto de capa: Daniela Felix/Jornal A Sirene)

O dia 5 de novembro de 2015 transformou as nossas vidas de diversas maneiras. Cada um de nós, em nossas particularidades, sabe o que tem feito mais falta. Somente nós e mais ninguém. Somos pessoas simples e só temos pensado em voltar para a roça, em resgatar o modo de vida que tínhamos. Enquanto lutamos para que esse dia chegue, também temos vivido para além da lama. E é apesar dela que não desistimos de tentar manter nossa gente unida e, por isso, fazemos questão de continuar com os festejos e as celebrações que são típicos das nossas comunidades, como a festa do padroeiro Santo Antônio, em Paracatu. Portanto, os laços que nos unem como comunidades sempre vão existir, pois nós cuidamos da nossa gente e, mesmo que o cansaço insista em nos enfraquecer, não deixamos de continuar. Maria Geralda, moradora de Paracatu, insiste: “Se a gente deixar se perder, não vamos ter isso em Lucila”. Se a gente deixar se perder, não vamos ter isso também em Bento Rodrigues, em Gesteira ou em outros futuros lares.

Viver para além da lama e ainda ter medo do que ela pode causar

Para nós, moradores de Santana do Deserto, tem sido difícil viver para além da lama, que já nos atingiu uma vez. O tempo pós-rompimento se transformou no medo de um novo crime ser cometido, com as “obras de reparação” que a Renova/Samarco/Vale/BHP têm feito para “solucionar” os danos causados por Fundão. Com isso, as empresas que nos tiraram a relação que tínhamos com o rio, hoje, também nos privam da tranquilidade, da segurança e do convívio nos espaços que tínhamos para lazer. Em troca, somos obrigados a lidar com o dia a dia agitado causado pelas máquinas, pelos trabalhadores e ainda dividir a única estrada que liga Santana a Rio Doce com os caminhões dessas empresas.

Diante disso, constantemente, nos perguntamos: será mesmo que uma das alternativas para o manejo de rejeitos é a construção de mais uma barragem? Até quando as empresas mineradoras continuarão a ameaçar pessoas e cidades inteiras com obras para sustentar seu mercado financeiro?

Não aceitaremos e também não ficaremos calados(as) diante das manobras criminosas dessas mineradoras, já que está claro que o benefício é sempre para elas, e nunca para nós. Continuaremos reportando todas as violações que elas ainda nos causam, pois isso também é uma forma de vivermos para além da lama.