Editorial (setembro/2018)

(Foto de Capa: Eduardo Moreira/Jornal A Sirene)

O “céu de Paracatu”, nossa foto de capa para esta edição, representa uma das magias que podíamos contemplar somente de lá, do nosso lugar. Por incontáveis vezes, falamos sobre esses tipos de experiências que estão guardadas em nossas memórias. É, também, por elas que lutamos para construir nossa Matriz de Danos, instrumento que obriga a Samarco  a reconhecer nossas perdas e a reparar o crime que “nos tirou até o céu”.

Tão inumeráveis quanto essas estrelas são os nossos bens perdidos, que somados a todos os detalhes, caracterizavam nossas vidas e cotidiano. Vidas de quem tinha o costume de criar galinhas soltas pelo quintal, de quem traçava, para cada uma delas, um propósito diferente. Então, não admitimos que essas, ou outros tipos de perdas, sejam classificadas do mesmo jeito. Veja, por esse exemplo dá para perceber a injustiça: tem galinha separada para criar, tem galinha que é boa para botar ovos, tem galinha que botava ovos azuis, ou que era produtiva até certo tempo e depois não servia mais. Tem galos e galinhas de raças variadas e que, às vezes, só deixávamos no terreiro para poder ficar olhando e ouvindo o seu “cacarejar” enquanto o tempo ia passando. É por isso que não conseguimos entender ou aceitar o que a Fundação Renova/Samarco tem nos apresentado como plano de reparação.

Inaceitável também é o jeito como as mulheres atingidas precisam provar, às vezes mais dos que os homens atingidos, suas perdas de renda ou de formas de sustento. Desse modo, reivindicamos que os nossos direitos não sejam limitados ao gênero ou a qualquer outra regra que nos exclua de alguma forma. Se tudo o que temos conseguido é resultado de muita luta, também lutaremos por igualdade.

A inauguração da nova sede da Escola de Paracatu, no centro de Mariana, é mais um exemplo dessa nossa batalha diária. Depois de longos meses, nossas crianças e adolescentes conquistaram um espaço mais adequado para estudar. E isso é muito importante para nós, porque reconhecemos, na escola, um ambiente que proporciona momentos importantes para o futuro, para o recomeço de nossas vidas.

Este Jornal A SIRENE também tem sido uma ferramenta significativa para unir nossas comunidades e, assim, nos dar forças contra as empresas causadoras do crime e os seus discursos. É um canal de comunicação aberto exclusivamente para nós, atingidos(as) pelo rompimento da Barragem de Fundão, termos condições de narrar nossas próprias histórias. De modo que, assim, celebramos a realização do projeto “Oficinas de Repórteres Populares”, ocorrido nos mês passado e ainda nesse que se segue, pois, com ele, conseguiremos ampliar a importância da comunicação, além de entender sobre as formas como podemos usar a nossa voz para dar vez aos nossos direitos. Uma forma também de lembrar a eles que nunca deixaremos de soar a sirene que eles não tocaram!