O museu do crime

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Foto: Joice Valverde

[/vc_column_text][thb_gap height=”20″][vc_column_text]Dentre as estratégias de publicidade da Fundação Renova, uma tem localização central na cidade de Mariana e funciona como atração turística. Os(As) visitantes, quando saem, levam a sensação de que sabem o que se passa nas comunidades atingidas e de que a fundação/empresas estão reparando os danos. Nós, que estamos do outro lado e vivemos a realidade, sabemos que o casarão da Renova mente, assim como a fundação. 

Por Simária Quintão e Maria Carneiro (Lilica)
Com apoio de Joice Valverde e Larissa Pinto

 

Eu nunca tinha entrado para ver isso. É ridículo. A nossa realidade não tá ali, minha comunidade não é representada. A maquete só mostra os lugares mais conhecidos. Não tem a zona rural, pularam Ponte do Gama, falam só de Paracatu, mas não mencionam Paracatu de Cima e Paracatu de Baixo. Falta Bicas, Pedras, Campinas, Borba, Barretos. Comunidades que não tiveram lama no território, como Governador Valadares, são mencionadas e nós não. 

Lilica, moradora de Ponte do Gama

 

Eu não me sinto bem nesses lugares. Nunca fui visitar e não pretendo, porque não vou ver mentira. Se eu chegar lá e alguém tiver contando uma história pra um turista que é mentira, vou querer contar a verdade e, então, vai ter problema. Todo fim de semana estou em Bento Rodrigues, eu passo em Lavoura. Vejo ao vivo e vejo a verdade. 

Simária Quintão, moradora de Bento Rodrigues

 

Ali é ponto turístico para mostrar a versão deles. Se eu não fosse atingida e visitasse esse museu do crime, iria acreditar no que tá ali. Se uma pessoa vem de fora para conhecer a história do rompimento da barragem, é o que tá ali. A não ser que ela procure saber mais, mas a maioria não quer saber. Só chega, assiste e vai embora pra casa.

Lilica, moradora de Ponte do Gama

 

O casarão, para mim, não tem utilidade nenhuma, porque não mostra a verdade. Quem vai se encanta e acha que está tudo bem. Mauro, outro dia, falou certo, a Renova faz hipnose e ilusionismo, porque ela hipnotiza quem vai lá. 

Fizeram aquele casarão lindo, gastaram uma grana, se for olhar, ficou maravilhoso igual o marketing deles, mas não beneficia a cidade. Por mim, aquilo não existiria, só vou lá quando sou obrigada a pegar um documento. Entro com vergonha e com medo, porque, só de entrar lá, os outros já falam que você tá indo buscar dinheiro. É humilhante entrar nesses lugares. A empresa não tá me dando nada, ela tem de repor o que me tirou e não vai conseguir repor nem metade.

Simária Quintão, moradora de Bento Rodrigues

 

A Renova já tem tantos escritórios pela cidade, não tem necessidade de ter outro aqui. É que o Jardim é um ponto de referência, né? Para nós, atingidos, esse museu não tem serventia nenhuma. Por ser um lugar para os atingidos, devia ter a nossa participação sempre. O dinheiro que eles gastaram com essa casa deveria ir para os atingidos. 

Lilica, moradora de Ponte do Gama

 

Eles queriam fazer o “Vim Ver”* em Bento Rodrigues. Eu e Mauro que barramos porque o “Vim Ver” deles é louco. “Vim Ver” do criminoso? Do assassino? Não! E lá não tem nada que eles fizeram para se ver. As únicas coisas que fizeram foram dois cemitérios enormes, que são os diques S3 e S4. Lá tem restos de seres humanos, de animais, histórias de vidas. Tudo nosso tá ali debaixo. 

Eu falei com eles: lá no Bento, para mostrar alguma coisa pra alguém, somos nós. A verdade é única e é nossa. Não deixamos ter esse “Vim Ver” lá no Bento, porque lá não é deles, lá é nosso. 

Simária Quintão, moradora de Bento Rodrigues

 

* ‘Vim Ver’ é o programa de turismo do crime oferecido pela Fundação Renova/empresas. Leia mais na reportagem “O que eles querem ver?” da edição nº 27 do Jornal A Sirene.

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