Cronologia de uma destruição

Eles pensam que é só um monumento, espere um momento,
ela tem dor e sentimento,
a casa da mãe Conceição também tem coração.
Ali, a rezar eu aprendi, o beabá da fé foi ensinado,
lá, a primeira comunhão, meu batizado,
tantos outros sacramentos realizados.
Meu pai e minha mãe, naquela antiga capela,
uma tarde de primavera,
entraram os dois solteiros e saíram de lá casados,
não é mentira, é verdade, tinham muitas testemunhas desta veracidade.
Quantos outros casais ali começaram suas famílias,
e seus filhinhos se livraram do pecado original na Pia Batismal,
quantos corpos encomendados,
aqui foram passados da vida para uma outra vida, ao lado,
sementes plantadas lá onde vivem os mortos, irrigados pelo chafariz de São Francisco de Assis.
Agora eu olho para aquela modesta casa de orações
e os meus olhos não querem ver, a capela nua totalmente descoberta,
A Samarco aplicou a pena, e a Renova, num projeto de lei esculpido no rejeito,
quer transformar a casa da mãe Conceição e toda a reparação, neste ato,
num templo amaldiçoado a Baco.
Mas eu sei que, mesmo que caiam as paredes,
o Pai Eterno, assessorado pela Nossa Mãe,
jamais vai sancionar algo de diferente
naquele solo consagrado à minha gente.
Por Sérgio Papagaio


Capela em 2020, 5 anos depois dro rompimento. Foto: Simone Silva
