Direito de Entender: Prescrição – Ação coletiva e ação individual

Por Guilherme de Sá Meneghin, Promotor da 1ª Comarca de Mariana

A prescrição é a extinção da possibilidade de requerer judicialmente a reparação para um direito que foi violado. De acordo com o artigo 189 do Código Civil Brasileiro, quando desrespeitado um direito, nasce, para o(a) cidadão(ã) titular, a reivindicação por justiça, a qual, se encerra, pela prescrição, nos prazos determinados nos artigos 205 e 206 desse mesmo código.

Segundo o autor Flávio Tartuce, na prescrição, ocorre a extinção do prazo de se ajuizar uma ação, porém o direito em si permanece preservado. “Tanto isso é verdade que, se alguém pagar uma dívida prescrita, não pode pedir a devolução da quantia paga, já que existia o direito de crédito que não foi extinto pela prescrição.”♦

No caso do desastre da Barragem de Fundão, o prazo de prescrição para requerer a indenização é de três anos, contados a partir da data do fato (5 de novembro de 2015), conforme artigo 206, §3º, V, do Código Civil. Mas, apesar desse prazo se aplicar como regra, é preciso diferenciar o tratamento da prescrição na ação coletiva e na ação individual.

Ação coletiva

No que diz respeito à ação coletiva, chamada de ação civil pública, é válido relembrar que ela foi ajuizada no dia 10 de dezembro de 2015, pelo Ministério Público de Minas Gerais, e segue na 2ª Vara da Comarca de Mariana. Durante o andamento do processo, a prescrição não corre, ou seja, ainda que essa ação coletiva seja julgada após os três anos, no dia 5 de novembro de 2018 não haverá prescrição.

Ação individual

Em relação à ação individual, é importante destacar que qualquer pessoa pode requerer individualmente a reparação dos danos sofridos, contratando advogado(a) particular, solicitando à Defensoria Pública ou negociando diretamente com as empresas e a Fundação Renova. É uma escolha do(da) atingido(a) e não existe qualquer obstáculo para fazer essa opção.

No entanto, cumpre dizer que, se o(a) atingido(a) fizer a negociação direta com a Fundação Renova, por meio do Programa de Indenização Mediada (PIM), ou por meio de ação individual, ele não poderá exigir a indenização pelos mesmos danos sofridos na ação coletiva ajuizada pelo MPMG.

O prazo de prescrição para a ação individual é de três anos, mas a jurisprudência brasileira não tem entendimento firmado a respeito da influência da ação coletiva na ação individual. E, por isso, há, pelo menos, três posicionamentos sobre isso no Brasil.

O primeiro deles afirma que a ação coletiva não interrompe e nem suspende o prazo para a ação individual: portanto, a prescrição da ação individual correria a partir do dia 5 de novembro de 2015, encerrando-se no dia 5 de novembro de 2018.

O segundo entendimento diz que o ajuizamento da ação coletiva interrompe a prescrição da ação individual. Nesse caso, a prescrição se iniciaria no dia 10 de dezembro de 2015 (quando foi ajuizada a ação coletiva) e terminaria no dia 10 de dezembro de 2018. Esse foi o posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial 1.641.167.

O terceiro entendimento defende que não prescreve a reparação dos danos ambientais e, assim, os danos causados a terceiros, derivados de violações ambientais, teriam a prescrição suspensa enquanto o meio ambiente não fosse reparado.

Por isso, com o objetivo de evitar a insegurança desses posicionamentos, o Ministério Público, as comissões de atingidos(as) e a Assessoria Técnica da Cáritas trabalham para que as empresas reconheçam a obrigação de indenizar as vítimas, por meio de um termo de transação e matriz de danos homologados pela Justiça na ação coletiva.

A homologação desse acordo valerá como uma nova interrupção da prescrição, ressurgindo o prazo de três anos para requerer indenização, e, ainda, com a vantagem de que o(a) atingido(a) terá instrumentos suficientes para essa finalidade: termo de transação e matriz de danos (título executivo judicial) e dossiê formado através do cadastramento das pessoas atingidas (provas dos seus direitos).

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♦ TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017, p. 323.