“A gente entende que, enquanto no mínimo mais de 50% da comunidade escolar não voltar, a escola deveria continuar aqui”

No dia 1o de novembro, aconteceu na Casa de Cultura de Mariana a coletiva de imprensa que faz parte da campanha “Mariana 8 anos: a reparação na balança das Geraes” promovida pela Cáritas Brasileira Regional, com representantes da Comissão dos Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF). O objetivo da campanha é relembrar os oito anos do maior crime socioambiental do Brasil, cometido por Samarco, Vale e BHP, e destacar a luta dos atingidos e atingidas em busca de reparação integral.
Desde o crime, o corpo discente, docente e o quadro de funcionários das escolas de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo passaram por diversas situações de instabilidades e hostilidades, entre migrações forçadas, bullying e espaços improvisados. Durante a coletiva, a questão das novas escolas nos reassentamentos foi abordada. Os alunos da Escola Municipal de Bento Rodrigues começaram as aulas na escola do reassentamento no segundo semestre de 2023. Segundo relatos de estudantes, a nova escola é grande, possui uma brinquedoteca equipada e uma biblioteca extensa. As aulas de Paracatu ainda estão ocorrendo na escola improvisada no bairro Barro Preto, na sede de Mariana.

Luzia Queiroz levantou questionamentos sobre a possível mudança do corpo estudantil em 2024 para a escola do reassentamento de Paracatu.
“Estão falando que ano que vem as escolas já estarão todas funcionando em seus territórios, dentro do que já estavam estudando, e tem crianças que têm que sair daqui, né? Um ônibus pra ir estudar, depois voltar. O nosso de Paracatu ainda não começou, mas já tá sendo um problema porque são quase 40 km [entre a sede e o reassentamento]. Daqui a Paracatu, então, uma criança tem que levantar qual horário, se ela estuda de manhã?”
Luzia Queiroz, moradora de Paracatu de Baixo
A logística das crianças que residem em Mariana atualmente para estudar no reassentamento foi uma das preocupações demonstradas por Luzia. Além das dificuldades de horário, a condição da estrada também foi comentada.
“A gente vê que a estrada tá perigosa porque os carros ainda estão transitando em altas velocidades. Elas [as famílias] têm medo de entregar à escola, no caso, para cuidar dos filhos; e se acontecer alguma coisa no meio do caminho? Morreu, enterra, indeniza e olha lá… A gente não quer isso, a gente quer estar do lado do filho, acompanhando. Então, a gente entende que, enquanto no mínimo mais de 50% da comunidade escolar não voltar, que ela [a escola] deveria continuar aqui.”
Luzia Queiroz, moradora de Paracatu de Baixo
O morador de Bento Rodrigues Manoel Marcos Muniz (Marquinhos) também acredita que é preciso esperar a população ir morar no reassentamento para que a comunidade escolar seja transferida.
“A gente até luta junto para que espere todo mundo estar lá dentro de Paracatu para a escola começar a funcionar. Eu vejo que causa transtorno aos alunos. Não são alunos adolescentes, é muita criança, vamos dizer aí de 7,8 anos, 5 anos e por aí afora. A questão é: e se acontece alguma coisa dentro do canteiro de obra? Se acontece alguma coisa na estrada? O que tenho a dizer, se fosse da minha vontade, esperava toda a população estar dentro do reassentamento para a escola estar funcionando.”
Manoel Marcos Muniz, morador de Bento Rodrigues
Anderson Jesus de Paula, morador de Paracatu de Baixo, comenta sobre a luta por ensino de qualidade em conjunto com as dificuldades que os alunos e alunas enfrentam ao ter que lidar com a logística e as condições de obras em que os reassentamentos estão.
“A gente já luta pela qualidade como qualquer brasileiro, não é Mariana, qualquer brasileiro já luta pela qualidade de educação pública com qualidade. Além da gente ter que brigar pela qualidade da educação, a gente ia ter que ter esse cansaço de submeter as nossas crianças a esse risco de acidente e o cansaço físico de deslocar 80 km por dia, porque pra empresa é simplesmente fornecer um transporte.”
Anderson Jesus de Paula, morador de Paracatu de Baixo
Enquanto as preocupações tomam conta da comunidade, a escola de Paracatu permanece provisoriamente na sede de Mariana. As previsões são para que o ensino seja transferido para o reassentamento em 2025, no entanto, a diretora Sônia Soares afirma que a escola está se preparando para a mudança já prevista em 2024 — -que, caso seja adiada, permanecerá sob controle, sem prejudicar os alunos.
Texto: Amanda Almeida
Apuração: Alexandre Coelho, Amanda Almeida, Karine de Oliveira Costa e Yasmim Paulino
Edição: Karina Gomes Barbosa
Fotografia: Yasmim Paulino
Leia também: