Audiência discute problemas de saúde das pessoas atingidas por barragens

No dia 21 de março ocorreu uma Audiência Pública e Deliberação Extraordinária para discutir questões de saúde das pessoas atingidas pelas barragens de Brumadinho e do Fundão.
O deputado federal Rogério Correia (PT-MG) coordenou a audiência, que contou também com a presença de representantes de assessorias técnicas independentes (ATIs), pessoas atingidas, pesquisadoras, Ministério da Saúde e outros deputados.
Com início previsto para 14h30, a reunião começou perto de 15h e durou aproximadamente três horas. A audiência aconteceu na Câmara dos Deputados, em Brasília, e foi transmitida ao vivo. Um resumo está no Youtube. O objetivo principal era debater as questões de saúde dos atingidos pelas barragens.
A audiência contou com a presença de atingidos representantes das diferentes regiões atingidas pelo rompimento da barragem de Brumadinho. Marcus Rezende, da região 1, reforçou a questão da água contaminada: “Se a pessoa não está bebendo uma água intoxicada pela lama, ela tá bebendo uma água intoxicada por produtos químicos, como o cloro”. Marcus pediu medidas mais concretas e fiscalização de perto. “Nós da população queremos resultados, nós queremos acessibilidade ao SUS, nós queremos serviço de qualidade, queremos que esse serviço cumpra o seu papel, que a gente consiga efetuar um tratamento na questão psicológica – um tratamento eficiente, que vá nos permitir retomar as nossas vidas como eram antes desse crime que a Vale cometeu em Brumadinho. Isso está sendo negligenciado.”
Os representantes das regiões 2 e 3 relataram a inconformidade em relação à falta de participação dos atingidos. Renata Cristina Pereira, atingida da região 2, expôs sua indignação: “Onde estão as políticas públicas que até hoje não chegaram até os atingidos que sentem na pele, literalmente na pele, todo esse crime, todo esse terror que a Vale vem impondo sobre nós?”. Abdalah Nacif Neto, atingido da região 3, também demonstrou seu descontentamento: “Sem a participação dos atingidos, não é legítimo esse processo”.
Durante a reunião, foram discutidas denúncias em relação às pesquisas e às políticas públicas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A diretora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério de Saúde, Maria Juliana Moura Corrêa, lamentou o atraso de sete anos nas ações da pasta em relação à saúde das pessoas atingidas, tanto no momento do rompimento quanto nos efeitos a longo prazo percebidos até hoje. A proposta dela é iniciar estudos para descobrir o que está acontecendo com a saúde dessas pessoas.
A pesquisadora da Fiocruz de Minas Gerais Zélia Profeta também denunciou a negligência em relação à saúde de atingidos e atingidas, tanto no âmbito da pesquisa quanto no âmbito sistêmico. Ela aponta a importância de mais estudos, uma vez que as pesquisas já iniciadas demonstram resultados assustadores, como o aumento da diabetes em adultos e idosos, o índice de contaminação por metais pesados e adoecimentos mentais.
Ressaltando a criminalidade dos desastres, Alexandra Andrade, representante da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão em Brumadinho (AVABRUM), relatou os constantes sofrimentos de moradores e moradoras da região. Ao complementar o relato de Alexandra, o deputado federal Rogério Correia prestou solidariedade à associação: “A gente sabe a dor que vocês têm, e esse quadro da saúde se agravando. Então, é um crime que acaba sendo continuado. E a AVABRUM faz um trabalho de unificar essas pessoas, para não perder a esperança de recuperar pelo menos parte do que se foi com a tragédia criminosa acontecida em Brumadinho”.
Representante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Lina Anchieta Sales também criticou e denunciou os estudos realizados nas regiões. Ela apontou o descontentamento do movimento em relação à interrupção da pesquisa sobre a avaliação dos riscos à saúde humana realizada pela AMBIOS, laboratório ambiental, e à Renova por utilizar o método GAISMA (Gerenciamento Ambiental Integrado para Saúde e Meio Ambiente), desenvolvido pela própria fundação, nas pesquisas. O movimento também aponta os efeitos do rompimento em relação à contaminação da água, à quantidade de rejeitos nas enchentes – agora mais frequentes e intensas – e os problemas encarados pela população pela falta de recursos na saúde pública. Lina pediu a elaboração de um protocolo específico para o atendimento das famílias atingidas no SUS.
Sobre a repactuação que será feita sobre Mariana, a sanitarista e representante do Núcleo de Assessorias às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab), Gabriela Reis, apontou a falta de reparação dos danos a longo prazo, chamados de supervenientes. A exposição à água contaminada, efeitos na saúde (física e mental) e as falhas nas informações públicas por conta da não contemplação de toda a população em relação ao uso do SUS foram questões apontadas por Gabriela como fundamentais a serem discutidas e resolvidas.
A Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas) foi representada por Yasmin Vieira, que comentou sobre os resultados das últimas pesquisas realizadas pela associação. Além disso, Yasmin reivindicou que o Ministério da Saúde seja o articulador das políticas públicas específicas para os territórios atingidos, junto aos entes federativos do SUS que atuam na área e também que acompanhe a pauta da saúde no âmbito do acordo global.
Uma das reivindicações feitas na reunião foi de melhoria na acessibilidade da população ao SUS. Paula Junqueira Mota, do Instituto Guaicuy, que assessora as regiões 4 e 5 da Bacia do Paraopeba, ressaltou o problema da falta de transporte público para a população conseguir acessar os serviços, pois muitas comunidades não possuem centros em suas localidades. Paula também destacou os problemas nas pesquisas: população sendo desrespeitada; o não uso de linguagem popular; e o desvio de metodologia por parte das entidades.
Ao fim da reunião, o deputado federal Rogério Correia (PT/MG) criticou a resposta dada pelo Ministério Público ao pedido de revisão da decisão do corte de verba das assessorias técnicas relacionadas a Brumadinho. A comissão avalia a possibilidade de uma audiência pública para definição dos cortes e para um debate mais público.
Patrus Ananias (PT-MG) colocou o Poder Executivo como responsável por solucionar as questões discutidas. Já o deputado Padre João (PT-MG) lamentou a postura do Ministério Público e relatou sua indignação, pois para ele o Poder Executivo e o Judiciário agem como cúmplices do crime, diante da omissão do Estado.
Já está marcada para o dia 10 de abril, às 17h, em Belo Horizonte, uma reunião com as instituições de justiça para definição dos cortes e para um debate mais público sobre o tema das pessoas atingidas.
Por Marcella Torres