Revitalizando a história por meio da tradição

Trajados de branco, segurando faixas, balões e cantando hinos de luta, um grupo de moradoras e moradores de Antônio Pereira participou do Jubileu de Nossa Senhora da Lapa para pedir paz para o distrito no dia 15 de agosto. Nos últimos anos, a população do Pereira tem visto seu território e seus modos de vida serem atingidos pelos danos da mineração predatória praticada pela Vale. Com as obras de descomissionamento da Barragem Doutor, os danos à saúde física e mental, a perda de vínculos comunitários, tradicionais e familiares, e os prejuízos econômicos têm se tornado cada vez mais graves. Associado ao cenário de precarização do distrito, a população também tem visto aumentar os casos de violência, criminalização do território e violações de direitos. A fim de protestar e chamar a atenção das autoridades, a caminhada pela paz foi realizada.

Por Donizete de Fátima dos Santos Silva, Ivone Pereira Zacarias, Whelton Pimentel de Freitas (Leleco) e Padre Marcelo Moreira Santiago
Com o apoio de Tatiane Análio
“Nós estamos em uma luta contra a servidão mineral, porque a Pedreira Irmãos Machado quer tirar os moradores do seu entorno para explorar, e as pessoas estão lá há mais de um século. Então, é a nossa luta. Isso é defender o direito à moradia das pessoas. Eu acredito que a união faz a força, sabe? E nós temos que dar um basta nessa mineração que explora sem retorno nenhum para as comunidades, não é preciso tirar os moradores de suas casas, ela tem espaço para explorar sem agredir a comunidade.”
Donizete de Fátima dos Santos Silva,
presidente da Frente Popular em defesa de Amarantina
“É hoje a caminhada, né? A gente fez essa caminhada da fé porque nós já fazemos a caminhada dos garimpeiros, de luta porque nós somos de luta, lutando pelo nosso direito. A mineradora está nos prejudicando muito. Nós estamos sofrendo com a poeira e a mineradora nega aceitar que nós somos todos atingidos. A comunidade inteira é atingida. E, há dias atrás, houve uma violência aqui. Esta caminhada é um pedido para que Nossa Senhora derrame paz na nossa comunidade, porque nós queremos que a nossa comunidade volte a ser o que era antes. Nós tínhamos paz, tínhamos alegria, tínhamos o direito de ir e vir. Não temos mais, porque a mineradora acabou com tudo. Nós vamos continuar lutando pelo nosso direito, porque nosso direito vem, se não vir nosso direito, o Brasil perde também.”
Ivone Pereira Zacarias
“Calcado nessa proposta, da gente ter o reconhecimento do patrimônio material e imaterial, mas também uma preservação de costumes, que traz renda, que é o garimpo tradicional, tem ainda essa dificuldade dos termos ‘tradicional’ e ‘artesanal’, e a confusão daqueles que se fazem garimpeiros, mas são mineradores. Aqueles que estão aqui debaixo das barragens, que estão falando para a gente de garimpo, estão falando pra gente que o grande perigo está aí. Mineração, violência policial e corrupção são reais por aqui. A mineração, além de tudo, destrói a condição do poder popular, ela não reconhece as organizações, não reconhece as lideranças, né?”
Whelton Pimentel de Freitas (Leleco), Deputado Estadual de Minas Gerais
“Nós celebramos a festa em honra à Nossa Senhora da Lapa. É uma devoção, como foi recordado, a mais antiga romaria que se tem em Minas Gerais, aqui se iniciou. Este ano, são 301 anos de romaria que sai da Igreja Queimada, na entrada de Antônio Pereira, e que se dirige a essa Gruta de Nossa Senhora, que se tornou, anos atrás, um Santuário Mariano Arquidiocesano. A grande área tem quase 10 mil metros, é uma área que pertence à Arquidiocese de Mariana, é um santuário religioso, mas é também pela beleza da natureza, uma área preservada chamada de monumento natural. Isso foi um grande alcance por causa da situação em torno de Antônio Pereira, distrito que sofre faz anos com a mineração predatória, chegando mais e mais empresas terceirizadas com a exploração do minério nessa área. Cada vez chegam mais empresas, nós tivemos notícia de que está chegando uma próxima a nós aqui nessa área vizinha, na nossa área de proteção ambiental e de proteção religiosa, que vai explorar minério. A nossa preocupação é muito grande, porque coloca em risco a gruta e, ao mesmo tempo, tira também do nosso povo esse espaço sagrado que tem mais de 300 anos de história. Nós ficamos reféns da mineração, isso é uma coisa triste. A caminhada pela paz vem justamente ser um grito do nosso povo, da nossa gente para vencer toda uma mineração predatória que traz impactos sociais e ambientais para a vida do nosso povo e que agride esse monumento natural, o Santuário Arquidiocesano Mariano de Nossa Senhora da Lapa.”
Padre Marcelo Moreira Santiago, reitor do Santuário e pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus